Etimologia – a quase impossível tarefa de descobrir a origem das palavras que usamos no Brasil

Volta e meia, algum órgão de imprensa, pelas mãos de algum colunista abnegado, decide comentar os casos de “falsa etimologia” que infestam a internet. Trata-se de historietas que soam verossímeis para o cidadãos não versados em latim e grego, que atribuem uma “origem” completamente falsa a uma palavra de uso corrente no idioma. O fenômeno é, até mesmo, objeto de estudos acadêmicos, dado o seu potencial para produzir efeitos nefastos, como “o cancelamento de palavras com viés político e ideológico”.

Porém, a nosso ver, os casos de “falsa etimologia” não são uma doença, apenas o sintoma de um mal muito maior: a dificuldade imensa que o cidadão brasileiro comum enfrenta quando tenta descobrir a verdadeira etimologia de uma palavra qualquer de seu idioma.

Vi-me nessa situação hoje, ao ler a notícia sobre o cometa que será visível nos céus do Brasil neste domingo. Fiquei curioso: afinal, qual seria a origem da palavra “cometa”?

Comecei a busca pelo meu recém-adquirido, novíssimo, ainda com cheiro de papel novo, “Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa”, de Antônio Geraldo da Cunha, 4ª edição, da editora Lexikon. Reproduzo a seguir o verbete, exatamente como está impresso, com toda a formatação de caracteres do original:


cometa sm. ‘astro de luminosidade fraca, que gira em torno do sol, e em muitos dos quais forma-se uma longa cauda’ XIV. Do lat. cometa, deriv. do gr. kometes. No port. ant. o voc. ocorre predominantemente como feminino. || cometoMAN. CIA XX || cometoMANTE XX .


Muito bem: sabemos que a palavra vem do grego kometes. Mas o que tal palavra significa em grego? É isso que queremos saber quando pesquisamos a etimologia: o significado exato da palavra raiz, e é exatamente isso que não encontramos nesse dicionário!

Decidi, então, consultar o dicionário Priberam e, no final do verbete, encontrei a seguinte observação:


cometa

Origem etimológica:latim cometa, -ae, do grego kométes, -ou.


Mais uma vez, aprendemos que a palavra vem do grego, mas não temos a menor ideia sobre o que ela significava no idioma original.

Prossegui a pesquisa consultando o dicionário Aulete, onde constam estes dizeres no final do verbete:


cometa

[ê]

sm.

[F.: Do gr. kométes pelo lat. cometa. Ideia de ‘cometa’: comet(o)-, cometografia.]


Outra vez, chuva no molhado: o dicionário informa a palavra original, mas não esclarece seu significado.

A próxima parada foi ao dicionário Houaiss que, além de não ter um URL amigável para cada verbete, requer uma conta no UOL para acesso. Na aba “etim.” do verbete, encontramos o texto a seguir:


cometa (1344 cf. IVPM) ortoépia: ê

gr. komḗtēs, ou (no sentido definido), pelo lat. comēta,ae; o vocábulo era feminino no port. ant., por infl. da terminação; ver comet(o)-; f.hist. sXV comete


Por algum estranho motivo, parece que os dicionaristas da língua portuguesa decidiram em solene conclave que o cidadão em busca do significado etimológico de uma palavra deve ser fluente em latim e grego e especialista em decifração de abreviaturas.

Cansado dessa rotina, decidi pesquisar a palavra em outros idiomas. A resposta saltou imediatamente no dicionário francês Larousse:


comète

nom féminin

(latin cometes, du grec komêtês, chevelu)


Traduzo: “Substantivo feminino. Latim cometes, do grego komêtês, cabeludo”.

Está esclarecido! O que é um “cometa”? É um astro “cabeludo”! Detalhe: descobre-se o significado sem necessidade de decifrar abreviações!

Em Inglês, o excelente website “Etymonline” oferece uma explicação ainda mais completa e esclarecedora:


comet (n.)

“one of a class of celestial bodies which move about the sun in great, elliptical orbits,” c. 1200, from Old French comete (12c., Modern French comète), from Latin cometa, from Greek (aster) komētēs, literally “long-haired (star),” from komē “hair of the head” (compare koman “let the hair grow long”), which is of unknown origin. So called from resemblance of a comet’s tail to streaming hair.


Tradução do verbete acima: “Membro de uma classe de corpos celestes que se movem ao redor do sol em grandes órbitas elípticas”, c. 1200, do Francês Antigo comete (12c., Francês Moderno comète), do Grego (aster) komētēs, literalmente “estrela de cabelos compridos”, de komē “cabelo da cabeça” (compare koman “deixar o cabelo crescer”), cuja origem é desconhecida. Assim chamado pela semelhança da cauda do cometa com cabelos esvoaçantes”.

É exatamente isso que queremos ler quando pesquisamos a etimologia de uma palavra! Não queremos apenas saber que a palavra original em grego (ou latim, ou árabe, ou tupi, ou em dialeto africano, ou…) era esta ou aquela, mas qual o seu significado original, qual foi a metáfora, metonímia ou analogia que deu à luz o significado atual! Porque os dicionaristas brasileiros e portugueses assim não procedem é mais um mistério para o qual terão dezenas de explicações, mas nenhuma justificativa.

Para não dizer que não temos esperança de acesso tão fácil à origem etimológica das palavras quanto os falantes de inglês e de francês, a empresa 7Graus mantém um site ainda incipiente, com reduzidíssimo número de palavras, em que é possível encontrar verbetes valiosíssimos como o que se segue:


Cometa

Vem da segunda parte da expressão grega aster kometes, literalmente “estrela de cabelos longos”, termo derivado de komes (“cabelo”; não há relação com koma, que deu o coma da linguagem médica). O nome foi dado pela nuvem luminosa que envolve o núcleo do cometa, que dá a impressão de uma longa cabeleira flutuando ao sabor do vento. Os antigos astrônomos falavam dos cometas como se eles tivessem uma estrutura análoga à de um animal, denominando suas partes de cabeça, cauda e coma (ou cabeleira), terminologia até hoje utilizada em Astronomia.


Este é o tipo de dicionário etimológico capaz de liquidar de uma vez por todas com a circulação de falsas etimologias entre nós. Basta simplificar, facilitar, tornar acessíveis as explicações verdadeiras de forma inteligível, sem essa profusão absurda de abreviações, pelo cidadão comum interessado em descobrir a origem das palavras em nossa língua. Se a empresa 7Graus dedicasse uma parte de seus recursos à expansão desse projeto, mediante formação de parcerias com universidades e captação de financiamento privado, mantendo esse espetacular padrão de simplicidade e riqueza de informações, prestaria um serviço de valor inestimável ao nosso país e a todos os falantes de língua portuguesa ao redor do mundo.

Carta aos Gramáticos e Filólogos do Brasil — Por uma Gramática dedutível

Uma “regra” é um enunciado de validade geral que permite (1) entender os casos particulares conhecidos e (2) deduzir os casos particulares desconhecidos.

Essa noção elementar escapa por completo aos nossos gramáticos, que parecem sentir um prazer especial em multiplicar casos particulares que contrariam as regras que eles mesmos enunciam, sob pretextos como “forma consagrada pelo uso”.

Ora, as regras servem justamente para evitar que o indivíduo precise conhecer todos os casos particulares. Quando se diz que uma forma é consagrada pelo uso, cria-se a obrigação de conhecê-la previamente, impedindo-se o uso do raciocínio dedutivo diante de uma forma desconhecida.

Especialmente no caso do uso do hífen, criou-se uma situação impossível: ou você memoriza todas as palavras do dicionário que devem ser hifenizadas, ou jamais conseguirá deduzir se uma palavra desconhecida deve ou não ser escrita com hífen!

A Gramática do idioma é um campo do conhecimento que praticamente a totalidade da população, à exceção dos que dedicarão sua vida às Letras, estudará apenas uma vez na vida, durante o período escolar, após o qual deverão dedicar-se exclusivamente ao aprofundamento no estudo de sua profissão. Não é realista esperar que toda a população seja composta de filólogos — afinal, os filólogos também precisam dos serviços dos médicos, dentistas, fisioterapeutas, contadores, técnicos de laboratório, eletrotécnicos, operários das mais diferentes indústrias, administradores públicos e privados… Assim, é necessária e urgente uma Gramática composta de regras que todos os cidadãos de todas as profissões consigam aprender, tão desprovida quanto possível de exceções e casos particulares indedutíveis, ou dedutíveis apenas por filólogos ou outros especialistas no estudo do idioma!

A tarefa que se impõe é a de ensinar 210 milhões de pessoas a escrever correta e uniformemente, seja qual for a profissão que venham a seguir, seja qual for o tempo que dedicarão de suas vidas ao estudo do idioma, ainda que não mais do que os quatro anos iniciais do ensino fundamental.

Os gramáticos e filólogos devem chamar para si a responsabilidade de garantir que os brilhantes cientistas do Butantan e da FIOCRUZ responsáveis pelas vacinas que eles próprios receberam não precisem perder precioso tempo na redação de seus artigos e relatórios científicos indagando-se se a palavrinha X que desejam escrever deve ou não ser hifenizada! A criação de regras claras, destituídas de um número de exceções que inviabilize a memorização por não especialistas deve ser um objetivo incansavelmente perseguido, para o bem de todos — inclusive dos especialistas!

Se a Gramática não ensina a escrever, como aprender?

Os compêndios de Gramática, inclusive os melhores, não passam de grandes catálogos em que se classificam os eventos do idioma tal como surgem no texto de grandes autores.

Não é preciso pensar muito para concluir que uma classificação é apenas uma tentativa de ordenação racional das coisas do mundo. Uma classificação não indica causas, razões ou motivos: limita-se a pôr em ordem as coisas cujas causas, razões ou motivos serão investigados posteriormente.

Ora, qual é a causa de um texto? É, sem dúvida, a intenção de dizer alguma coisa a um leitor. As “gramáticas” simplesmente não abordam esse tema, não se impõem a tarefa de explicar ao estudante quando ele deve optar por uma ou outra forma de escrita em função de sua intenção de dizer.

O grande problema de grande parte dos cursos de Redação da atualidade é o que o próprio professor não conhece esses critérios. Na verdade, a maioria nunca sequer pensou nesses termos. Eles partem da esperança de que a simples correção de incontáveis “redações” ao longo de anos a fio ensinará o estudante a escrever bem pelo simples método de tentativa e erro. Se pelos frutos conhecemos a árvore, a horrenda decadência dos textos produzidos no Brasil é testemunho bastante da falta de fundamento racional dessa esperança!

O ponto-chave é que muitos professores de Redação falham em entender que a Gramática não é uma camisa de força: há muitas maneiras gramaticalmente corretas de dizer as mesmas coisas. Mas qual delas é a melhor? Por que esta forma, e não aquela, seria capaz de dizer melhor o que desejo comunicar àquele leitor específico que tenho em mente?

Essas são questões a que as gramáticas não respondem, mas que correspondem à angústia fundamental de todo escritor, seja um autor consagrado com os dedos erguidos no ar à espera da primeira palavra de sua nova obra-prima, seja um estudante suando frio diante da folha de prova em branco.

Ensinar a escrever é ensinar a escolher. O professor de Redação deve ensinar aos estudantes critérios de seleção de formas gramaticalmente corretas de escrever, ao estilo “quando quiser dizer A, escreva da forma A1 ou A2; por outro lado, quando a intenção for dizer B, escreva da forma B1 ou B2”.

É evidentemente impraticável um elenco exaustivo das possíveis intenções de dizer de cada uma das pessoas do mundo. Mas a experiência demonstra que é, sim, perfeitamente possível ensinar critérios gerais que, servindo de bússola ao estudante, orientam sua percepção para torná-lo cada vez mais consciente de suas decisões linguísticas. O estudante deixa de preocupar-se com “regras” sem significado para a tarefa que tem diante de si, ocupando sua inteligência exclusivamente com o desafio de encontrar a melhor forma de dizer o que quer ao leitor que tem em mente.

Esta é, em síntese, a proposta deste Curso Online de Redação:

(1) Ensinar ao estudante mais de uma centena de critérios para escolha de formas gramaticalmente corretas de escrever;

(2) Praticá-los e experimentá-los em exercícios práticos;

(3) Julgá-los em função de sua eficácia na expressão da intencionalidade do escritor.

Após completar este curso online de redação, o estudante estará plenamente capacitado a decidir por si mesmo, com total independência, como escrever o que deseja dizer ao seu leitor.

Para o estudante que segue disciplinadamente as instruções e as segue até o final, este é o último “Curso de Redação” que precisam fazer na vida. Quando os ex-alunos do curso decidem continuar estudando, é porque têm em mente o desenvolvimento de formas textuais especializadas, como o texto literário ou publicitário, plenamente conscientes de que seria impossível aprendê-las sem dominar os critérios gerais para a produção de textos, isto é, as formas de dizer o que desejam ao seu leitor ideal.

Para começar agora mesmo a conquistar sua independência intelectual na produção de textos comunicativos e eficazes em Língua Portuguesa, faça já sua matrícula!

Meu site de poemas… E um esboço de manifesto.

Impelido por um pervasivo e sempiterno desejo de escrever poemas, além do impulso de unir palavras à ação, decidi, em julho do ano passado, retomar o hábito e publicar os resultados um site pessoal, nada criativamente chamado, confesso, de “Poemas por Alexei Gonçalves de Oliveira“. Desde então, compus 28 poemas originais, recuperei um poema antigo (1988?), 3 traduções de poemas no idioma inglês e 2 traduções de poemas em romeno. O que exponho a seguir são as concepções, por assim dizer, “teóricas”, que orientaram essa modesta produção e que refletem minha atual concepção da Arte Poética e um esboço de proposta para um hipotético e urgentemente necessário movimento literário.

Em termos mais simples: nos tópicos abaixo, explico o que estou tentando fazer quando escrevo um poema e publico nesse site. Se tenho sucesso ou não, é um julgamento que não cabe a mim, mas ao leitor.

  1. Forma a serviço do pensamento. Uma poema é um delicado jogo de encaixe de um pensamento com uma expressão sonora e uma forma visual. Alguns poetas esforçam-se para encaixar seu pensamento a marretadas numa forma predefinida. Outros, apenas dizem o que pensam numa forma vagamente poética. Minha proposta é subordinar a forma visual e musical ao pensamento, para que funcione como um veículo, um meio de transporte, para uma ideia, uma imagem, um sentimento, um conceito, uma visão de mundo. Primeiro, o pensamento; depois, a forma. Se o pensamento pedir uma forma rígida, que seja. Se for indispensável quebrar o pé de um verso, ou dois, ou dez, para que o pensamento melhor se expresse, faço-o sem culpa. Se a ideia exige uma forma mais fluida, sigo em frente.
  2. Musicalidade e ritmo. Tento dotar a pronúncia de meus versos de fluidez sonora, seja qual for o tema ou a forma escolhida. Porém, a influência do jazz me faz apreciar ritmos irregulares, imprevisíveis, inesperados; mudanças súbitas no andamento e trocas constantes no compasso, modulações e mudanças de tom, escalas e acordes exóticos, dissonâncias, entre outros. Não espere a musicalidade previsível de sambas e modinhas! Inspirações constantes: “Take Five”, de Dave Brubeck; “Giant Steps”, de John Coltrane; “So What”, de Miles Davis; “Ornithology”, de Charlie Parker. Impossível, claro, afastar por completo a influência do hard rock e do heavy metal de minha adolescência, para o qual compus um poema, “A Romântica Lira de Chumbo“.
  3. Romantismo. Na supracitada “Lira de Chumbo”, compus estes versos: “Sou um Romântico, mas não um romântico / Que canta amores de bar e motel”. Do Romantismo, extraio a liberdade formal, uma certa dose de sentimentalismo, muitos arroubos e algumas pitadas subjetividade. Não concebo um pensamento desacoplado de um correspondente sentimento, mas não me afilio ao pieguismo, nem ao dramalhão, nem aos ideais revolucionários, nem ao individualismo exacerbado que marcam muitas fases e autores do movimento Romântico.
  4. Atualidade dos clássicos. Na suíte de poemas “Fobos” e “Deimos“, trago a Mitologia grega à atualidade, sugerindo que os problemas brilhantemente diagnosticados no berço de nossa civilização continuam vivos, atuais, cortando carne e vertendo sangue. Já em “A mais jovem das deusas pagãs” atrevi-me a narrar mitologicamente o nascimento e a vida de uma entidade cuja sombra se espraia por toda a civilização contemporânea.
  5. Temas e problemas contemporâneos. Meus poemas não cantam o passado, ou questões eternas, ou terras idílicas, ou fantasias atemporais, mas o que o derredor me envia aos olhos. Há amplo espaço para o noticiário político, para a Teoria Econômica, para as pessoas e instituições que nos elevam e insultam, tanto quanto para a tecnologia onipresente em que você me lê.
  6. Vocabulário vitaminado. A Língua Portuguesa, riquíssima como é, tem uma penca de palavras para cada  finalidade imaginável. Por isso, recuso-me a chamar de “poesia” a qualquer texto que não exija do leitor médio pelo menos uma visita ao dicionário a cada estrofe e nem um verso escrevo em linguagem de telenovela ou de botequim.
  7. Rimas imprevisíveis. Fugindo ao debate “rima rica, rica pobre”, quando opto por escrever um poema rimado tenho satisfação em pesquisar longamente as opções de rimas até encontrar um par inesperado pelo leitor. Não escrevo rimas para os olhos, mas para os ouvidos, refletindo a pronúncia vigente no Brasil de hoje.
  8. Traduções tão fiéis à forma quanto à mensagem. Quando traduzo um poema, meu esforço é sempre no sentido de preservar tanto a forma quanto a mensagem. Meu ponto de partida é imaginar como o poeta escreveria aqueles versos caso fosse um brasileiro do primeiro quartel do século XXI. Daí para frente, é um jogo de encaixe, em que desbasto as sobras para manter o essencial. Às vezes, até dá certo.
  9. Retorno à linguagem do século XIX. A poesia brasileira do século XX foi presunçosa, feia e chata. Empobreceu o idioma e as formas expressivas ao limite do ridículo até conduzir nosso povo a esta situação de surdez poética generalizada, em que praticamente a totalidade da população portadora de diploma universitário jamais leu um poema inteiro em sua vida e, os poucos que leram, consumiram apenas porcarias. Em meus poemas, escritos nos poucos minutos disponíveis entre um compromisso profissional e outro, tento, solitário Brancaleone, liderar um exército inexistente rumo a um objetivo impossível: reivindicar a herança dezenovista desprezada pelos pretensiosíssimos modernistas e retomar sua obra do ponto em que pararam. Se me faltam o talento, o conhecimento e a cultura para vencer, que permaneçam pelo menos a ideia e o exemplo pendentes pomos das Hespérides à espera de uma mão heroica que se digne a colhê-los.

Curso gratuito: Introdução à Leitura Poética

No artigo “Texto é Música” desenvolvi a ideia de que um componente importante da dificuldade de escrever é a falta de refinamento auditivo de nosso povo que se manifesta na quase impossibilidade de “ouvir” um texto, fenômeno que chamei de “surdez textual”. Entre as medidas que sugeri para “tratamento” da surdez textual, incluí a leitura de Poesia do período anterior ao Modernismo:

“Leia poemas de todos os períodos anteriores ao Modernismo (o Modernismo tem grande parcela de culpa pela nossa “surdez textual”), recitando-os em voz alta. Experimente diversas entonações, ritmos, expressões faciais, tons de voz…”

Desde a publicação desse artigo, tomei uma iniciativa destinada a contribuir para a mitigação desse problema: a criação de uma série de videoaulas gratuitas disponíveis em meu canal no Youtube, o “Curso de Introdução à Leitura Poética”. O propósito desse curso é incentivar mais brasileiros a descobrir o prazer de ler Poesia de alta qualidade, ensinando e discutindo todos os fundamentos necessários para uma fruição desta forma superior de escrita. Produzi, até o momento, 4 aulas, sobre os seguintes temas:

  • Aula 1 – O que é Poesia? Nesta aula, apresentei as definições e os componentes essenciais da linguagem poética. Ao assistir a este vídeo, você saberá o que distingue a Poesia de outras formas textuais, quais são suas características essenciais e o que deve observar ao ler um poema. Você também aprenderá a identificar a Poesia na sua vida cotidiana e dominará dois critérios identificadores da qualidade de um bom poema.
  • Aula 2 – Síntese visual. A aula 2 se concentra no estudo da mensagem visual do poema e seus significados. Você aprenderá a desfrutar da forma visual dos poemas que vier ler, relacionando a visão, a audição e a mensagem.
  • Aula 3 – Poesia e Música. Na aula 3, você receberá instruções práticas para ouvir a “Música” por trás de cada poema, melhorando sua capacidade de entendimento e recitação.
  • Aula 4 – O significado do Poema – Parte I – O Campo de Significação. Nesta aula, você começará a integrar o conhecimento adquirido nas aulas anteriores para extrair o pleno significado de um poema.

Embora tenha interrompido a sequência de vídeos devido a questões profissionais, pretendo abordar na aula 5 alguns recursos extras para extração do significado do poema, habilitando você penetrar cada vez mais fundo na forma mais elevada e avançada da escrita em qualquer idioma: a Poesia.

 

Como escrever para influenciar os líderes

Olavo de Carvalho ao lado de Jair Bolsonaro em jantar nos EUA

O influente escritor Olavo de Carvalho ao lado do presidente Jair Bolsonaro em jantar nos Estados Unidos.

Ainda sobre aquela dica de redação fajuta, tão imortal quanto os vilões de filmes de terror – “Escreva frases curtas” – gostaria de lembrar, primeiramente, que a frase é apenas um componente do texto, uma variável em um complexo que inclui vocabulário, parágrafos, ideias e, o elemento-chave, sempre esquecido, chamado LEITOR.

Frases curtas poderiam ser mais eficazes apenas para leitores de baixíssima instrução, não fosse um problema elementar: pessoas de baixíssima instrução não leem, não gostam de ler e, portanto, o melhor caminho para chegar até elas não é o texto, mas o vídeo. Se você pretende ganhar a vida escrevendo, precisa ter em mente pessoas que sabem ler e gostam de fazê-lo. Ora, uma pessoa que gosta de ler aprecia boas frases, entediando-se rapidamente diante de textos que não passam de uma sucessão de “tuítes” (“tweet”), de frasezinhas ao estilo “vovó viu a uva”.

Frases curtas, estritamente falando, são aplicáveis apenas a certas situações muito específicas, como tuítes, slogans, títulos, memes, em que o redator dispõe apenas de um número limitado de caracteres para trabalhar, porque o objetivo desse tipo de mensagem é constituir um comando hipnótico para o leitor. A intenção é “gravar” uma mensagem na mente do leitor sem que ele dedique tempo para analisá-la, questioná-la e compreendê-la em profundidade. O que se espera, nessas situações, é apenas uma resposta emocional ou comportamental imediata, semelhante à esperada de cachorros diante comando do adestrador: Sente! Deite! Role! Ataque! Quieto!

Se o objetivo de seu texto, por outro lado, é exercer influência sobre líderes e influenciadores, especialmente aqueles que estejam mais próximos ao topo da “cadeia alimentar” em empresas, órgãos governamentais e outros tipos de organizações de grande porte, você não concretizará esse objetivo com frases curtas ao estilo dos tuítes, memes e slogans publicitários!

Basta ler o texto de alguns dos maiores influenciadores da web, que mantêm páginas com longos blocos de texto e frases muito mais longas do que o recomendado pelos disseminadores de “dicas de redação”. A Wikipédia é um exemplo cabal, um dos sites mais acessados do mundo, fonte de informação e conhecimento para milhões de pessoas, cujas páginas contêm textos e frases longas.

No âmbito da literatura empresarial voltada para os líderes das maiores empresas do mundo, a McKinsey Quarterly, a Harvard Business Review, a Forbes, entre tantos outros, fogem completamente à regra de “textos curtos e frases curtas”, porque se dirigem a pessoas que simplesmente não estão dispostas a pautar suas decisões com base em memes e tuítes!

Um bom exemplo nacional é o jornalista Reinaldo Azevedo, que se tornou um dos blogueiros mais lidos e influentes do país escrevendo textos longuíssimos para os padrões da web nacional, com preocupação zero quanto à redação de frases longas e vocabulário relativamente sofisticado em relação à média nacional.

Mas, se é para falar em brasileiros influentes, não podemos deixar de mencionar os artigos de Olavo de Carvalho, que escreve corriqueiramente frases com 40 palavras ou mais e cuja influência, hoje, estende-se até ao presidente da república. Analise o parágrafo abaixo, publicado em seu perfil no Facebook:

“O típico imbecil do nosso tempo não é assim chamado por ser simplesmente um imbecil que por coincidência nasceu em determinada época e não em outra; não o é nem mesmo por haver uma ligação íntima entre a nossa época e a sua imbecilidade – embora essa ligação sem dúvida exista –, mas porque o sentimento de pertencer a essa época, ao famoso ‘nosso tempo’, constitui de certo modo o núcleo e o ponto forte do seu modo de ser imbecil. Com efeito, o que o caracteriza e define, distinguindo-o de todos os demais imbecis que já passaram por este mundo em outros séculos, é a sua total incapacidade de desligar-se mentalmente, por uma fração de segundo, das crenças e hábitos vigentes na nossa época, e de tentar ver as coisas como os homens do passado as viram ou como os do futuro poderão vê-las quando chegarem a este planeta. Tudo, de fato, ele enxerga e julga segundo o que aprendeu das duas autoridades supremas cuja fé pública inabalável molda e define o ‘nosso tempo’: a mídia e a escola – duas entidades que têm, entre outras propriedades maravilhosas, a de jamais discordar entre si. Tão intensa e profunda é a devoção que o imbecil contemporâneo tem ao ‘nosso tempo’, que chega a ver nele virtudes e poderes que antigamente se atribuíam a Deus. ‘Nele vivemos, nos movemos e somos’, murmura ele em seu coração, orgulhoso de nada ser além de produto, criatura e filho de tão excelsa entidade, à qual deve não somente a existência, mas também a essência.”

Um parágrafo. Cinco frases. 259 palavras. Média: 51,8 palavras por frase. No momento em que escrevo este artigo, o Facebook informa que essa publicação obteve mais de 3.500 curtidas, 753 compartilhamentos e 71 comentários.

Agora analise o texto, palavra por palavra, e confira se há alguma entre elas que seja inútil, irrelevante ou, de outra forma, dispensável para transmitir a ideia.

Não há.

Você pode discordar das ideias do texto. Você pode até mesmo odiá-las. Mas precisa admitir que essas cinco frases são perfeitas segundo o critério de incluir apenas palavras relevantes que apresentamos no artigo anterior.

É esse o tipo de texto que influencia as pessoas que sabem e gostam de ler – especialmente, os líderes: textos em que cada palavra contém uma ideia e contribui inequivocamente ao desenvolvimento da ideia maior que se deseja transmitir.

Se você pretende escrever apenas comandos hipnóticos para um público iletrado, recomendo que você aprenda a redigir roteiros para vídeo. Mas se você pretende exercer influência sobre líderes, aprenda a redigir frases que veiculem ideias, sem preocupar-se com o número de palavras. Caso precisar de ajuda nesse processo de aprendizagem, dirija-se à página de matrícula deste Curso Online de Redação.

Vovó viu a uva ou “a dica de redação mais furada de todos os tempos”

Nesta manhã, ainda mais uma vez entre centenas dos últimos 30 anos, li em uma rede social a dica de redação mais furada de todos os tempos: “Escreva frases curtas”.

Esse é o tipo de frase que me provoca urticárias porque, assemelhando-se a um pináculo do bom senso, na verdade desorienta mais do que informa, confunde mais do que educa, não resolve o problema a que se dirige e, para completar, é inteiramente falsa.

Sim, falsa. Não se preocupe em escrever frases longas ou curtas, mas frases do tamanho certo.

Mas estou me adiantando. Antes de explicar o que é uma frase “do tamanho certo”, precisamos perguntar o que é uma frase “curta”. Afinal, qual é o tamanho a partir do qual a frase deixa de ser curta? Cinco palavras? Dez? Vinte? Quarenta? Sessenta?

Ou seja, de cara, se você usa um adjetivo ao transmitir instruções a uma pessoa, você precisa definir clara, objetiva e inequivocamente o que significa esse adjetivo. Portanto, a dica “Escreva frases curtas” é inútil, porque não diz ao escritor qual o tamanho máximo da frase que ele deve escrever.

Se disséssemos, “escreva frases com, no máximo, 15 palavras”, poderíamos até criticar esse limite mas, pelo menos, teríamos um critério em mãos passível de obediência à falta de melhor argumento. Já a recomendação de “frase curta” é simplesmente exasperante, enlouquecedora, por sua absoluta ineficácia.

Como disse, não basta adjetivar: precisamos demonstrar; de preferência, com um exemplo prático. Tomemos uma frase perfeita por todos os critérios gramaticais, estilísticos e comunicacionais que se possa imaginar, um verdadeiro clássico da boa comunicação escrita:

Vovó viu a uva.

Por que dissemos que essa frase é perfeita? Porque é “curta”, contendo apenas quatro palavras?

Certamente, não. Essa frase é perfeita porque cada palavra contém um fragmento da mensagem, da ideia que o escritor deseja transmitir ao leitor! Observe:

QuemVovó
Fez o quê?viu
O quêa uva – isto é, uma uva específica, não um conjunto genérico de uvas!

Ou seja, não há sequer uma palavra inútil nessa frase! Se você disser “viu a uva”, o leitor perguntará “quem”? Já se você disser apenas “Vovó viu”, o leitor imediatamente retrucará “Viu o quê?”

Se, por outro lado, você escrever “Vovó a uva”, o leitor ficará coçando a cabeça ruminando mentalmente o que afinal, ó raios, você quis dizer!

Portanto, uma frase é perfeita quando contém apenas palavras úteis, isto é, que contribuem para o entendimento do significado da frase – ela mesma, a famosa “mensagem”!

Reescrevamos a “dica”. Em vez de “escreva frases curtas”, diga “elimine todas as palavras inúteis de sua frase”. Vejamos mais um exemplo prático:

A adorável anciã genitora de minha mãe contemplou esgazeada um lustroso exemplar individual do nobre fruto da videira.

Esse é o tipo de construção a que os professores de Gramática chamam “preciosismo” e que os professores de Redação chamam, no Português simples do dia a dia, de “enrolação”. Basicamente, o escritor está usando palavras e mais palavras para dizer, apenas, simples e precisamente, que “vovó viu a uva”.

De fato, apenas duas palavrinhas acrescentam alguma informação em relação ao original: “esgazeada” e “lustroso”. Assim, caso esses adjetivos sejam relevantes no contexto da comunicação, você poderia escrever:

Vovó, esgazeada, viu a lustrosa uva.

E a frase também seria perfeita, tão perfeita quanto a original, embora contivesse maior número de palavras!

Em resumo, você deve apenas incluir palavras relevantes em suas frases. Corte todos os excessos, os preciosismos, as repetições desnecessárias, os conectivos deslocados – enfim, tudo o que não for útil à comunicação com seu leitor!

Caso você queira saber mais sobre como redigir frases de forma eficiente e eficaz para todos os tipos de situação, basta fazer já sua matrícula neste Curso Online de Redação!

Dicionário analógico: a palavra exata para cada ideia

Uma ferramenta excelente, e pouco conhecida, para incrementar a precisão na escolha de palavras de seu texto – isto é, a seleção das palavras certas para cada ideia que você deseja expressar – é o dicionário analógico. Primeiramente, entenda que um dicionário analógico não é um “dicionário de sinônimos”, mas um compêndio que registra, de forma cômoda para consulta, um conjunto de palavras que sugerem ideias semelhantes ou, de algum modo, relacionadas. Com um dicionário analógico em mãos, você pode explorar múltiplas opções para enriquecer o vocabulário de seus textos com palavras cujos significados expressam suas ideias praticamente sem ambiguidade ou dificuldade de interpretação.

Na Língua Portuguesa, temos o magnífico trabalho de Francisco Ferreira Azevedo, intitulado “Dicionário analógico da Língua Portuguesa“, atualizado pela editora Lexicon.

capa do dicionário analógico da Língua Portuguesa de Francisco Ferreira Azevedo

O excelente dicionário analógico de Francisco Ferreira Azevedo, reeditado pela Lexicon.

Além da opção em livro físico, você pode contar com a versão online, que usaremos para criar um exemplo prático. Digamos que você tenha escrito a palavra “discussão” em um texto mas, por algum motivo, não está satisfeito com sua escolha. Veja o que acontece quando digitamos essa palavra no dicionário analógico:

O sistema solar nos resultados do dicionário analógico.

Um “sistema solar” linguístico: o dicionário analógico exibe a palavra pesquisada no centro, cercada pelas ideias que ela sugere.

O dicionário analógico exibe uma espécie de “sistema solar”, com a palavra “discussão” posicionada no centro, com cinco outras palavras “orbitando-a”: “Dissertação” – “Discórdia” – “Investigação” – “Raciocínio” – “Palestra”. Essas palavras representam as ideias que podem ser expressas pela palavra “discussão”. Após perguntar a si mesmo qual dessas ideias é mais próxima da que você desejava expressar em seu texto, dê um clique e observe o que acontece em seguida:

O verbete do dicionário analógico: uma constelação ordenada por sua classe gramatical.

O dicionário analógico exibe uma “constelação completa” de palavras que expressam ideias semelhantes à pesquisada, ordenadas por sua classe gramatical.

O dicionário analógico exibe uma “constelação” de palavras, locuções e expressões ordenadas segundo sua classe gramatical (substantivo, adjetivo, verbo, advérbio, etc), que sugerem ideias relacionadas a “investigação”. Muitas vezes, um rápido exame dessa lista é o bastante para localizar a palavra certa para seu texto. Mas, caso fique em dúvida sobre uma das opções, dê-lhe um clique para ter acesso à sua definição no dicionário principal, ou a outro verbete do próprio dicionário analógico.

A prática no uso constante dessa ferramenta provocará uma evolução vertiginosa na riqueza do vocabulário que você usa em seus textos e na sua capacidade geral de expressão de ideias complexas. Experimente usá-la para reescrever algum texto antigo de sua própria autoria e observe o salto de qualidade que ele dará!

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Dicas de vocabulário: do genérico ao específico

Uma das mais elementares dificuldades que os brasileiros enfrentam quando precisam redigir um texto mais “sério” do que a média das publicações e comentários nas redes sociais é a escolha das palavras mais adequadas para expressar os seus pensamentos. Como o vocabulário da maioria de nossos compatriotas é limitado ao exigível pelos temas corriqueiros das conversações cotidianas e aos termos técnicos essenciais à prática profissional, é notável a tendência de empregar, nos textos mais sérios, as mesmas palavras que se diria nessas situações menos formais, sem suspeitar da inadequação de seu significado ao sentido que se pretende comunicar.

Um critério objetivo extremamente útil para enfrentar o problema da seleção de palavras reduz-se a uma fórmula de memorização e aplicação bastante simples: “Quando em dúvida entre duas palavras, selecione a de significado mais específico”. A palavra de sentido mais amplo, com maior número de significados possíveis, sempre abrirá margem a erros de interpretação sobre a intenção do autor justamente devido à sua ambiguidade.

Uma maneira simples de aplicar esse princípio é consultar num dicionário os verbetes correspondentes e escolher a palavra que tenha o menor número de significados diferentes registrados. Por outro lado, nem sempre os dicionários registram todas as nuanças de sentido subentendidas no uso que se faz de uma palavra em uma determinada época. Assim, o escritor precisa não apenas conhecer os significados dicionarizados, mas dispor de ampla compreensão quanto às ideias implícitas na escolha das palavras por seus contemporâneos.

Vejamos alguns exemplos de palavras que, amplamente adotadas como “muletas” para um vocabulário pobre, poderiam ser substituídas com vantagem por outros termos mais específicos.

Verbo “cuidar”

CERTO: O enfermeiro é responsável por cuidar de pessoas doentes.

NÃO USE: O advogado é o profissional que cuida dos interesses dos seus clientes junto ao Poder Judiciário.

“Cuidar” é um verbo muito genérico, inespecífico, normalmente aplicável, no campo profissional, a babás (“cuidam” de crianças”), enfermeiras (“cuidam” de pessoas doentes) e profissionais assemelhados, tais como os “cuidadores” de idosos.

Um aspecto essencial do uso adequado do verbo “cuidar” é a dependência total do receptor dos “cuidados” em relação ao “cuidador”, tal como o bebê depende da mãe, o paciente, dos enfermeiros e, os idosos, dos “cuidadores”. Assim, não podemos dizer que um advogado seja um “cuidador”, exceto num sentido metafórico injustamente desabonador para a nobre profissão!

Em resumo, nos exemplos, você pode manter o verbo “cuidar” em referência ao trabalho dos enfermeiros. Já para os advogados, opções mais adequadas poderiam incluir os verbos “representar”, “promover”, “defender”, “proteger”, “escudar”, “preservar”, “resguardar” ou “salvaguardar”.

Finalmente, observe que, nas listas acima, eu não usei a palavra “errado”, substituindo-a pela expressão “não use”. O motivo dessa escolha de palavras é simples: nossa intenção aqui não é criar leis, mas aprender a nos comunicar. Então, da mesma forma que há muitas coisas que não são ilegais, mas não nos convêm, também há muitas coisas que a Gramática não proíbe, mas que não são recomendáveis ao escritor!

Verbo “possuir”

Use o verbo “possuir” apenas para se referir a relações de “posse” de objetos ou valores – ou seja, como sinônimo de “estar na posse de”:

CERTO: “Eu possuo um Camaro amarelo”, “Ele possui um milhão de dólares roubados”, “Ela possui uma linda coleção de sapatos”.

NÃO USE: “Ele possui uma linda família”, “Ela possui um bom emprego”, “Eu possuo um invejável currículo”, “João possui uma bela história de vida”, “Maria possui uma grave doença”.

Em todos os casos da lista “não use”, seria muito mais recomendável o simples e singelo verbo “ter”!

Verbo “bater”

CERTO: Uma ideia martelava sua cabeça.

NÃO USE: O marceneiro batia no prego

O verbo “bater” também é sinônimo de “espancar”, “surrar”. Ora, quando você “martela” um prego, sua intenção não é “espancar o prego”, mas “percuti-lo repetidamente até forçar sua penetração em algum tipo de material”.

Esse sentido do verbo “martelar” como sinônimo de “percutir repetidamente” é que o torna adequado à representação de uma ideia que se repete na mente de uma pessoa, “martelando” sua consciência.

Verbo “colocar”

CERTO: Coloquei todos os componentes nas prateleiras adequadas.

NÃO USE: Coloquei as meias antes de dormir.

O verbo “colocar” é mais bem empregado no sentido de “posicionar cuidadosamente com as mãos”. Para qualquer outra acepção, você sempre disporá de opções mais adequadas. No exemplo acima, você poderia “calçar” ou “vestir” as meias.

Artigo definido

CERTO: Localizei o artigo no livro que você indicou.

NÃO USE: Encontrei no livro a informação que procurava.

O artigo definido é chamado de “definido” justamente porque se refere a alguma coisa específica, e não a uma ideia abstrata ou conceito geral. Quando você menciona, no exemplo, “o livro” você precisa especificar a “qual livro” se refere. Caso contrário, use o artigo “indefinido”: “Encontrei num livro…”

Onde (advérbio)

CERTO: O verão é rigoroso na cidade onde nasci.

NÃO USE: As cartas onde registrei minhas ideias perderam-se no incêndio.

Prefira usar o advérbio “onde” apenas para se referir a um lugar físico: “a cidade onde nasci”, “o local onde trabalho”. Para outros sentidos, diga “em que”: “As cartas em que registrei minhas ideias…”.

Conclusão

Estes exemplos simples devem ter sido suficientes para entender o conceito: “quando em dúvida entre duas palavras, selecione a de significado mais específico”, isto é, mais adequado à ideia que você pretende comunicar. Os dicionários, por melhores que sejam, nem sempre registram todas as diferenças sutis no emprego de cada palavra – por isso mesmo, é fortemente recomendável que seus textos sejam lidos e revisados por um professor experiente até que você adquira confiança bastante em seu domínio sobre os significados das palavras. Confira nossos planos de curso e matricule-se já neste Curso Online de Redação.

Como redigir um texto explicativo

Você provavelmente já se viu na situação de assistir à aula de um professor esforçado, inteligente e erudito que explica, explica e explica a matéria durante horas a fio e, quanto mais explica, menos a turma entende. A paixão do professor pelo tema da aula, em muitos desses casos, é perceptível, quase palpável: os olhos brilham, a voz se exalta, os gestos entusiasmam… Mas a turma continua entendendo rigorosamente nada sobre o tema da aula.

Explicação num contexto gerencial: um funcionário graduado japonês explica o funcionamento de um equipamento complexo em uma fábrica. Autor da foto: Mikiyo Yamanaka.

As explicações não são indispensáveis apenas nas salas de aulas de escolas e universidades, mas adquirem importância central em uma ampla variedade de contextos. Na foto, um exemplo de explicação no contexto gerencial. Fotógrafo: Mikiyo Yamanaka.

Como faço para “saber explicar”?

Durante meus longos anos em bancos de escolas e universidades, ouvi centenas de vezes, sobre dezenas de professores, a sentença capital do corpo discente: “Ele pode até saber muito sobre o assunto da disciplina, mas não sabe explicar”. Sendo eu próprio um professor, preciso refletir constantemente sobre esse problema, pois é óbvio que não posso me dar ao luxo de receber de meus alunos uma avaliação tão desvantajosa acerca de meu trabalho. O desafio é, portanto, descobrir como explicar um assunto de modo a assegurar que a maioria dos alunos entenda nossa linha de raciocínio.

O primeiro passo para vencer esse desafio é entendê-lo do ponto de vista do estudante, não de uma teoria pedagógica ou filosófica qualquer. O que desejamos não é obter o reconhecimento da comunidade acadêmica, mas desvendar os princípios fundamentais que têm o potencial de tornar uma explicação compreensível por mais da metade de nossos alunos.

Explicações: necessárias para todas as profissões

Devemos salientar que as explicações não são necessárias apenas para professores durante o ato de ministrar disciplinas em escolas e universidades, mas adquirem importância central nos mais diversos contextos profissionais. Veja alguns exemplos:

  • Um profissional experiente necessita explicar aos aprendizes ou estagiários o modo correto de executar uma tarefa.
  • Um subordinado precisa explicar aos seus superiores hierárquicos como executou a tarefa de que foi encarregado.
  • Um advogado deve explicar as razões de seu cliente ao juiz e este, por sua vez, os fundamentos de sua decisão a todos os interessados.
  • Um aspecto essencial do trabalho do médico é explicar aos pacientes os detalhes do tratamento.
  • Qualquer prestador de serviços cujo trabalho envolva a elaboração de orçamentos – por exemplo, encanadores, mecânicos de automóveis, empreiteiros, contadores, consultores, dentistas, fisioterapeutas, designers, redatores, etc – terá de, rotineiramente, explicar aos seus clientes os detalhes que justificam o preço do serviço.
  • A maior parte do trabalho do vendedor consiste, essencialmente, em explicar ao cliente as vantagens do produto, as formas de pagamento, as garantias, etc.
  • Empresários e executivos estão sempre envolvidos na atividade de prover explicações a clientes, fornecedores, acionistas, bancos, prestadores de serviços e, também, a outros executivos da mesma empresa.

É fácil perceber que as explicações fazem parte da vida profissional da maioria das pessoas. A eventual falta de competência em explicar o próprio trabalho é capaz de arruinar carreiras de pessoas competentes e talentosas na execução do trabalho propriamente dito.

Explicar é selecionar

Voltemos, então, àquele professor mencionado no início deste artigo: esforçado, apaixonado, erudito, inteligente… Por que não consegue se fazer entender pelos alunos? Há diversas explicações possíveis mas, em todos os casos que testemunhei pessoalmente, um fator se apresentou de forma saliente e cristalina: a incompreensão do fato de que explicar é selecionar!

Basicamente, o problema é que o professor, por uma variedade de motivos que não cabe desenvolver aqui, desanda a “dizer tudo o que sabe” sobre o assunto. Ele inunda o cérebro dos alunos com uma quantidade avassaladora de dados, fatos, regras, exceções, exemplos, depoimentos, testemunhos, pesquisas, anedotas, mitos, definições, conceitos, enfim, uma torrente de informações sob a qual a linha de raciocínio submerge e desaparece. O resultado é que o aluno não consegue reproduzir as linhas gerais daquilo que ouviu!

Ora, caso o seu aluno não consiga reproduzir com as próprias palavras ao menos os componentes fundamentais de sua explicação, esteja certo de que ele não entendeu nada do que você disse e seu tempo foi jogado fora!

Critérios para a redação de bons textos explicativos

Quando você tiver a necessidade de redigir um texto explicativo, além dos princípios gerais da boa Redação em Língua Portuguesa, procure orientar-se pelos seguintes critérios:

  1. Selecione o que o leitor precisa saber. Controle o impulso de “dizer tudo o que sabe” sobre o assunto. O seu leitor não será capaz de memorizar e, portanto, de integrar ao seu raciocínio, um grande número de informações novas. Em vez disso, dedique um esforço adicional para descobrir qual é o conjunto mínimo de informações necessárias ao entendimento do assunto. Toda informação que não faça parte desse conjunto deverá ser cortada da explicação atual e, se necessário, apresentada em outro capítulo, subcapítulo ou, até mesmo, num apêndice.
  2. Apresente as informações gradativamente, uma cada de vez. Explique, desenvolva e exemplifique uma informação de cada vez, concedendo tempo ao cérebro de seus leitores para “assimilar”, “associar”, “classificar” e “arquivar” uma informação nova antes de apresentar a seguinte.
  3. Apresente as informações numa sequência lógica, que forme uma “história” com início, meio e fim, na mente do leitor. Em caso de dúvida, pense que sua explicação é como uma história em quadrinhos. Cada quadrinho mostra um fragmento de informação que, unindo-se aos fragmentos de informação apresentados nos outros quadrinhos, contribui para formar uma história completa e coerente. Porém, se você misturar a ordem dos quadrinhos, o resultado será ininteligível!
  4. Acrescente resumos e repetições das ideias-chaves em pontos estratégicos do texto. Esteja certo de que o leitor, ao chegar à metade do texto, já terá esquecido alguma informação fundamental apresentada no início. Por isso, é importante incluir “lembretes” em pontos estratégicos, sob as mais variadas formas: citações, resumos, quadros sinópticos, esquemas, ilustrações, gráficos, tabelas, fotografias, infográficos, entre muitos outros. O importante é assegurar-se de que todas as informações essenciais estejam disponíveis na memória do leitor durante toda a explicação.

É importante ressaltar que estes critérios para a redação de textos explicativos também são válidos para aulas expositivas e apresentações profissionais.

Finalmente, caso você necessite de um treinamento específico para aprender a redigir ótimos textos explicativos para todas as finalidades, basta fazer agora sua matrícula em nosso curso online de redação.

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