Texto é Música!

Talvez exagere um pouco, mas não muito, se afirmar que um dos grandes obstáculos nacionais ao desenvolvimento da Alta Literatura é a “surdez” generalizada do nosso povo, patologia induzida por música ruim e péssimos escritores. Mas, por favor, não saia correndo para marcar uma consulta com seu otorrinolaringologista, pois me refiro a um certo tipo de “surdez” que acomete pessoas dotadas de audição perfeita sob o ponto de vista fisiológico, manifestando-se sob a forma de uma incapacidade de “ouvir mentalmente” o texto que estão lendo.

Sem um ótimo ouvido, ninguém entende Poesia, nem consegue apreciar a Alta Literatura. Isso explica, em grande parte, o fato de que quase ninguém lê poesia no Brasil. Em caso de dúvida, pergunte a seus amigos e colegas de trabalho, faculdade ou escola se eles têm o hábito de ler poemas!

Sem um ouvido pelo menos medianamente desenvolvido, ninguém consegue entender nem mesmo o simples texto de um memorando ou de uma ata de reunião de condomínio.

A única maneira de desenvolver o ouvido dos leitores é desenvolver o ouvido dos escritores. Em diversas lições deste curso online de Redação, procuro despertar a consciência dos alunos para a existência do problema, porque simplesmente NENHUM “curso de redação”, nem básico, nem avançado, com que eu tenha tido contato nos últimos 30 anos, sequer tocou de raspão neste que é um fato essencial da escrita:

Imagem contém texto: "Texto é Música".

Texto é Música: todo texto tem uma sonoridade própria que integra, amplia e modifica seu significado.

O desenvolvimento da percepção da sonoridade de um texto é tema complexo, que exigiria um curso específico, com vários meses de duração. No entanto, além dos exercícios constantes deste curso, há diversas providências simples e práticas que você pode tomar para melhorar gradativamente, por conta própria, sua habilidade de apreciar um texto sonoramente agradável. O que apresento a seguir são sugestões avulsas, sem ordem de prioridade, nem sequência cronológica obrigatória. Se você puder seguir todas as sugestões ao mesmo tempo, ótimo! Caso contrário, mesmo que você aplique apenas uma dessas sugestões durante algumas semanas, é praticamente certo que experimentará uma melhoria sensível em sua percepção de sonoridade. Faça o teste!

  1. Ouça música erudita diariamente por, no mínimo, 30 minutos – basta uma pesquisa no Youtube para encontrar milhares de opções! Comece com peças de Bach para cravo e de Mozart para piano solo, sem orquestra ou outros instrumentos. As melodias desses dois compositores para esses instrumentos costumam ser bastante nítidas, fáceis de entender e de memorizar, bastante semelhantes a um discurso humano proferido em voz alta, o que facilitará a tarefa de perceber as notas musicais separadamente, tais como se fossem “sílabas”.
  2. Após ter ouvido, por várias semanas seguidas, algumas dezenas de peças de Bach e Mozart para piano e cravo, dê rédea solta à sua curiosidade e ouça outros compositores (Vivaldi, Haydn, Chopin, Liszt, Beethoven, a lista é imensa!), outros instrumentos (harpa, violino, viola, oboé, clarineta, trompa, órgão, são dezenas!) e outras formas de composição (sonatas, sinfonias, concertos, óperas, balés, danças, e siga adiante!).
  3. Compre audiolivros e ouça-os mantendo-se atento às pausas, à respiração, às mudanças de ritmo e à entonação do “locutor-leitor”.
  4. Grave a própria voz lendo uma página de um livro de Alta Literatura. Faça várias versões, alterando o ritmo, a altura, a entonação. Usando um programa editor de áudio como o Audacity, “monte” as melhores frases de cada versão em uma única sequência de áudio e aprecie o resultado.
  5. Leia poemas de todos os períodos anteriores ao Modernismo (o Modernismo tem grande parcela de culpa pela nossa “surdez textual”), recitando-os em voz alta. Experimente diversas entonações, ritmos, expressões faciais, tons de voz…
  6. Grave um bloco de um telejornal ou programa de rádio e transcreva as falas do locutor. Depois, leia suas transcrições, “ouvindo” o texto com a voz do locutor em sua mente, sem reproduzir o vídeo ou o áudio originais.
  7. Leia histórias em quadrinhos criando, em sua mente, diferentes “vozes” para os diversos personagens.
  8. Leia em voz alta, para uma plateia de crianças, histórias de contos de fadas, criando vozes diferentes para todos os personagens.

A última dica é a mais importante: após experimentar algumas das opções acima, divirta-se inventando seus próprios exercícios de desenvolvimento de seu “ouvido literário”! Quanto mais você se divertir exercitando sua audição, mais rapidamente desenvolverá uma audição aguçada para as melhores obras da Literatura e aprimorará a sonoridade de seus próprios textos!

E, claro, caso tenha a intenção de aprimorar todos os outros aspectos de sua habilidade de Redação, faça agora sua matrícula!

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