Ainda sobre aquela dica de redação fajuta, tão imortal quanto os vilões de filmes de terror – “Escreva frases curtas” – gostaria de lembrar, primeiramente, que a frase é apenas um componente do texto, uma variável em um complexo que inclui vocabulário, parágrafos, ideias e, o elemento-chave, sempre esquecido, chamado LEITOR.
Frases curtas poderiam ser mais eficazes apenas para leitores de baixíssima instrução, não fosse um problema elementar: pessoas de baixíssima instrução não leem, não gostam de ler e, portanto, o melhor caminho para chegar até elas não é o texto, mas o vídeo. Se você pretende ganhar a vida escrevendo, precisa ter em mente pessoas que sabem ler e gostam de fazê-lo. Ora, uma pessoa que gosta de ler aprecia boas frases, entediando-se rapidamente diante de textos que não passam de uma sucessão de “tuítes” (“tweet”), de frasezinhas ao estilo “vovó viu a uva”.
Frases curtas, estritamente falando, são aplicáveis apenas a certas situações muito específicas, como tuítes, slogans, títulos, memes, em que o redator dispõe apenas de um número limitado de caracteres para trabalhar, porque o objetivo desse tipo de mensagem é constituir um comando hipnótico para o leitor. A intenção é “gravar” uma mensagem na mente do leitor sem que ele dedique tempo para analisá-la, questioná-la e compreendê-la em profundidade. O que se espera, nessas situações, é apenas uma resposta emocional ou comportamental imediata, semelhante à esperada de cachorros diante comando do adestrador: Sente! Deite! Role! Ataque! Quieto!
Se o objetivo de seu texto, por outro lado, é exercer influência sobre líderes e influenciadores, especialmente aqueles que estejam mais próximos ao topo da “cadeia alimentar” em empresas, órgãos governamentais e outros tipos de organizações de grande porte, você não concretizará esse objetivo com frases curtas ao estilo dos tuítes, memes e slogans publicitários!
Basta ler o texto de alguns dos maiores influenciadores da web, que mantêm páginas com longos blocos de texto e frases muito mais longas do que o recomendado pelos disseminadores de “dicas de redação”. A Wikipédia é um exemplo cabal, um dos sites mais acessados do mundo, fonte de informação e conhecimento para milhões de pessoas, cujas páginas contêm textos e frases longas.
No âmbito da literatura empresarial voltada para os líderes das maiores empresas do mundo, a McKinsey Quarterly, a Harvard Business Review, a Forbes, entre tantos outros, fogem completamente à regra de “textos curtos e frases curtas”, porque se dirigem a pessoas que simplesmente não estão dispostas a pautar suas decisões com base em memes e tuítes!
Um bom exemplo nacional é o jornalista Reinaldo Azevedo, que se tornou um dos blogueiros mais lidos e influentes do país escrevendo textos longuíssimos para os padrões da web nacional, com preocupação zero quanto à redação de frases longas e vocabulário relativamente sofisticado em relação à média nacional.
Mas, se é para falar em brasileiros influentes, não podemos deixar de mencionar os artigos de Olavo de Carvalho, que escreve corriqueiramente frases com 40 palavras ou mais e cuja influência, hoje, estende-se até ao presidente da república. Analise o parágrafo abaixo, publicado em seu perfil no Facebook:
“O típico imbecil do nosso tempo não é assim chamado por ser simplesmente um imbecil que por coincidência nasceu em determinada época e não em outra; não o é nem mesmo por haver uma ligação íntima entre a nossa época e a sua imbecilidade – embora essa ligação sem dúvida exista –, mas porque o sentimento de pertencer a essa época, ao famoso ‘nosso tempo’, constitui de certo modo o núcleo e o ponto forte do seu modo de ser imbecil. Com efeito, o que o caracteriza e define, distinguindo-o de todos os demais imbecis que já passaram por este mundo em outros séculos, é a sua total incapacidade de desligar-se mentalmente, por uma fração de segundo, das crenças e hábitos vigentes na nossa época, e de tentar ver as coisas como os homens do passado as viram ou como os do futuro poderão vê-las quando chegarem a este planeta. Tudo, de fato, ele enxerga e julga segundo o que aprendeu das duas autoridades supremas cuja fé pública inabalável molda e define o ‘nosso tempo’: a mídia e a escola – duas entidades que têm, entre outras propriedades maravilhosas, a de jamais discordar entre si. Tão intensa e profunda é a devoção que o imbecil contemporâneo tem ao ‘nosso tempo’, que chega a ver nele virtudes e poderes que antigamente se atribuíam a Deus. ‘Nele vivemos, nos movemos e somos’, murmura ele em seu coração, orgulhoso de nada ser além de produto, criatura e filho de tão excelsa entidade, à qual deve não somente a existência, mas também a essência.”
Um parágrafo. Cinco frases. 259 palavras. Média: 51,8 palavras por frase. No momento em que escrevo este artigo, o Facebook informa que essa publicação obteve mais de 3.500 curtidas, 753 compartilhamentos e 71 comentários.
Agora analise o texto, palavra por palavra, e confira se há alguma entre elas que seja inútil, irrelevante ou, de outra forma, dispensável para transmitir a ideia.
Não há.
Você pode discordar das ideias do texto. Você pode até mesmo odiá-las. Mas precisa admitir que essas cinco frases são perfeitas segundo o critério de incluir apenas palavras relevantes que apresentamos no artigo anterior.
É esse o tipo de texto que influencia as pessoas que sabem e gostam de ler – especialmente, os líderes: textos em que cada palavra contém uma ideia e contribui inequivocamente ao desenvolvimento da ideia maior que se deseja transmitir.
Se você pretende escrever apenas comandos hipnóticos para um público iletrado, recomendo que você aprenda a redigir roteiros para vídeo. Mas se você pretende exercer influência sobre líderes, aprenda a redigir frases que veiculem ideias, sem preocupar-se com o número de palavras. Caso precisar de ajuda nesse processo de aprendizagem, dirija-se à página de matrícula deste Curso Online de Redação.